quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Tudo que é perecível

Quando eu olhar pro lado, eu quero estar cercado só de quem me interessa


Olhou mais uma vez. Eles estavam distraídos. Aproximou-se um pouco mais. A conversa os envolvia de tal forma, que não percebiam sua aproximação.

Pensou mais uma vez. Teria que correr. Mais alguns passos e estariam perto da esquina, a próxima rua desenbocava em mais duas e cada uma delas em outras três. As ruas de paralelepípedos são mais estreitas e os velhos sobrados têm pequenas portas difíceis de diferenciar.

Não tinha mais tempo para pensar. Estava fácil, tão perto da mão, era só esticar um pouco o braço. A caixa de isopor estava um pouco pesada, mas aguentaria correr mais do que aquele gordo mesmo que estivesse carregando alguém no colo.

Olhou mais uma vez. Sincronizou os passos, arrumou a caixa nas costas, esticou o braços e puxou de uma só vez. Com o celular nas mãos, correu o máximo que pode. Como previsto, o gordo tentou correr também, mas não poderia alcansá-lo.
A caixa pesava nas costas e atrapalhava a fuga. A mulher do gordo gritava, chamando a atenção de quem passava pela Rua da Lapa naquele momento. Um homem atravessou a rua correndo em sua direção. O gordo nunca o alcançaria, mas aquele homem...

Olhou mais uma vez para trás, a mulher do gordo gritando, a rua não havia chegado na metade, o homem que atrevessava a rua...desistiu.

Jogou no chão o flagrante, diminuiu os passos, olhou mais uma vez para trás. O homem havia parado para pegar o celular caído na calçada. Achou melhor correr mais um pouco, até a próxima esquina, talvez.


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Caminhavam calmos pelo centro da cidade. Saiu sem bolsa, pois não ia demorar, não precisaria carregar muita coisa, só as chaves e o telefone celular. A bermuda que vestia não tinha bolsos, pendurou as chaves no pescoço e levou o celular na mão direita.

Seguiam pelas ruas do bairro da Lapa, centro da boemia da cidade, redescoberto pelas novas gerações. Espaço dos mais democráticos do Rio de Janeiro. Onde circulam malandros e mocinhas, playboys e alternativos, funkeiros e emos, numa mistura de sons e gestos próprios de cada tribo. Tudo junto e misturado.
As ruas da Lapa têm a mesma cara durante o dia e não é difícil encontrar sujeitos dormindo, escorados em postes e muros, atordoados pelas consequências das extravagâncias da noite anterior.

Conversavam distraídos, caminhando a passos lentos. Em um fragmento de minuto, sentiu um tapa na mão.

O homem agora corria levando seu celular embora. Em um gesto instintivo correu atrás do ladrão, gritando pela rua a espera de auxílio.

Conseguiu vê-lo virar na primeira esquina e, alguns passos a frente, se desfazer do flagrante do crime.

Recuperaria seu celular e em algumas horas, sua calma.


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O serviço hoje estava calmo. Nada além das cobranças de sempre. Pensava no carnaval, na folga que não lhe cederam, no time que empatou no final de semana.

Alguma conversa sobre o tempo - o dia estava sendo o mais quente do mês. "Se até o fim de semana não chover, domingo aproveito a folga e levo as crianças pra andar de bicicleta no aterro".

Escolheu a mesa da porta pra não derreter no calor do interior da loja. Mais um gole na coca-cola. Já haviam recolhido o prato, mas ainda tinha alguns minutos do horário de almoço. Olhou em volta, um homem correndo, uma mulher que gritava e corria atrás dele.

Deu um salto no banco, sacou a arma, correu vinte metros e atirou.

Menos um vagabundo. "Chama a ambulância que esse foi pro saco".



Era uma quarta-feira, antevéspera de carnaval, ao meio dia.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Pensamentos soltos

Saltitando pelos caminhos


Andaram me questionando sobre minha forma de levar determinadas coisas. Sobre essa discarada ansiedade e esse jeito de viver como se fosse morrer no próximo minuto.

Não que eu pense que vá morrer hoje ou amanhã, mas em algum momento só me restará um minuto.

Considerando que eu vivo em uma cidade com um dos maiores índices de criminalidade do país, que eu pego estrada pelo menos quatro vezes por mês, que eu bebo consideravelmente, que não tenho hábitos alimentares muito saudáveis, que não pratico exercícios físicos com frequência e que tenho casos na famila de doenças com influências genéticas. Considerando ainda que eu pego o 175 todos os dias (com seus motoristas desgovernados) e, inevitavelmente, passo dentro de uma favela para chegar até o trabalho, que atravesso cerca de seis pistas de vias rápidas da cidade diariamente e que sou um pouco sem noção quando entro no mar, posso afirmar que corros riscos diários de morrer por doença, acidente, afogamento ou qualquer outra bizarrice dessas que a gente fica sabendo.

Não que eu pense em morrer, repito. Longe disso. Ando dizendo, inclusive, que quero viver até os 120 anos. (E há quem duvide).

Que a evolução tecnológica me permita ser feliz até lá, pois não será por isso que vou deixar de "me arriscar" todos os dias.

Já dizia o meu querido Cris: "Tem medo de se arriscar? Não sai na rua. Mas também não fica muito tempo em casa, porque falta de sol faz mal, falta de contato com gente dá depressão e dizem por aí que suicida tem uma sorte pior do que quem morre naturalmente."


"- É Vó, a gente acha que quer uma coisa, vai atrás dela, batalha, passa perrengue e quando consegue, tem logo que criar outra coisa pra querer.

- A vida é assim. O que não pode é parar de querer".

Sabedoria de quem já teve filhos, escreveu um livro e plantou uma árvore. (Mais do que isso, planta, diariamente, conhecimento na cabeça dos outros).



Essa coisa de inventar um mundo por dia e de viver como se esse fosse ser o último não tem nada de inconsequente ou irresponsável. (A popularização do termo Carpe Diem tem deturpado extremamente seu sentido).

"Isso de ser agitada... deve ser de santo".

Ando sentindo saudades de chão de terra batida.


"Quando eu me sinto um pouco rejeitada
Me dá um nó na garganta
Choro até secar a alma de toda mágoa
Depois eu passo pra outra
Como mutante
No fundo sempre sozinho
Seguindo o meu caminho
Ai de mim que sou romântica!"
(Rita Lee)

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Dei um aperto de saudade no meu tamborim

Molhei o pano da cuica com as minhas lágrimas


De tanto pensar, um dia as idéias tendem a se organizar. As primeiras já começam a se apresentar em uma ordem cronológica cabível. Meio passo de um primeiro. (Para quem não tem nada, meio é o dobro).

Segurança de ter a quem e onde recorrer também ajuda a pensar nos próximos passos.

Tenho uma tendência a enlouquecer quando tudo sai do lugar (ou quando entra demasiadamente no lugar). Vontade de parar a roda gigante e pular la de cima, cair de cabeça no mar e nadar até não aguentar mais.

Só o que tá doendo é começar a perceber que meu filho cresceu porque da ultima vez que eu estive com ele a sandalia ainda cabia.
Criando um mundo por dia, sonhando e deixando ser.

O melhor é que alguém me acompanhe, senão está arriscado que eu vá sozinha.



"Iaiá
Minha preta não sabe o que eu sei
O que vi nos lugares onde andei
Quando eu contar, Iaiá, você vai se pasmar
Quando eu contar, Iaiá, você vai se pasmar"
(Zeca Pagodinho)

domingo, 15 de fevereiro de 2009

O Parangolé tá valvulado

Caindo no samba pra levantar as idéias


- Shiiii.....
- O que foi, Arthur?
- Estou ouvindo os sons da natureza...


Às vezes, as palavras engasgam pra sair e as lágrimas falam mais que qualquer coisa.

Quanto vale a distância? Quanto vale o tempo que não se acompanha? Quanto de felicidade cabe num instante? Quanto de tristeza vale alguns instantes de felicidade?

Vontade de ter por perto se misturando com a vontade de ficar longe de uma porção de coisas. Vontade de voltar atras segurando vontade de seguir adiante.

A gente corre, corre, corre, mas nunca sabe exatamente onde quer chegar.

- Então é isso, mãe?
- Isso o quê?
- A gente nasce, cresce, trabalha, trabalha mais e morre?

Ando querendo uma casa no campo, meus bons amigos me cercando, meu filho correndo no quintal, meus livros e discos nas estantes, meu notebook no colo e minhas idéias valendo dinheiro o mais rápido possível.

Essa dedicação inumana nos faz perder todo o sabor da vida (já diria minha amiga Martha).

Dedicação Total a você fica lindo em slogan de financeira fastasiada de loja de eletrodomesticos e afins. Na prática, dedicação total é praticamente impossível e tende a nos levar a estafa.

Me sinto nova demais pra tanta coisa.

Em que parte da vida a gente se diverte?




"Minha carne é de carnaval
O meu coração é igual
Minha carne é de carnaval
O meu coração é igual
Minha carne é de carnaval
O meu coração é igual"
(Os Novos Baianos)

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Eu, que ainda tenho 16 anos

E já carrego tanta coisa pra contar


"Espaço é coisa que precisa ser delimitada desde o início, porque depois é muito mais difícil pedir : 'Chega pra lá'".

As nossas lições costumam valer melhor pros outros.

E eu, que pouco tenho a ver com isso, que percorro meus caminhos sozinha madrugadas a dentro. Eu, com seis anos além dos dezoito, mas às vezes com tão menos.

Eu que não sei lidar com tantos quereres e não-quereres assim. Que acho um baita desperdício não gostar de quem gosta de mim. Que vivo entre amor, amigos e no fim...ando vivendo só por mim.

Deve ser coisa de signo, isso de ser egocêntrico. Deve ser coisa de espírito, isso de não criar laços. Deve ser coisa de educação, isso de ser meio grossa.

E digo meio, porque não o tempo todo. No resto do tempo minhas verdades não ferem ninguém.

Pura contradição de quem não gosta de assumir culpas alheias (e nem as próprias, diga-se de passagem), de quem prefere acreditar no acaso e se responsabilizar pelos erros e seus consequentes contratempos.

Eu me contradigo, bem sei. Dizendo verdades e fugindo tantas vezes delas. Tudo forma de se proteger. Praticamente instintivo.

"Os bandidos mais covardes são também os mais medrosos." - Filosofia de van.

Dando um passo de cada vez, me desfazendo das amarras uma por vez, volto a me reunir nas minhas coisinhas.

Tudo que tenho hoje é uma cama, uma calça jeans, algumas camisas, um tenis all star e amores que teimo em me afastar.

Meu filho, família, amigos e amores se acumulam nos meus pensamentos sem que eu possa tocá-los, sentí-los, cheirá-los.

Escolhas.

"Gandhi pensava na evolução da humanidade, um monge no alto de uma colina, pensa em sua própria evolução. E isso não é egoísmo."

Ando precisando de terapia.




"E até lá, vamos viver
Temos muito ainda por fazer
Não olhe pra trás
Apenas começamos.
O mundo começa agora
Apenas começamos"
(Renato Russo)

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

It's all about us

Sigo sendo como posso

O que há em mim que não há em outros seres? Desses que andam pelas ruas debaixo do sol, em ônibus lotados, em vias rápidas, em vans e trens?

O que há em mim que me inquieta dessa maneira? Será a lua ou os hormônios?

Tudo em mim parece explodir em certos momentos. Um mundo de sonhos e desejos presos num corpo de um metro e meio.

Queria saber fazer música. Talvez fosse um belo remédio pras inquietações repentinas. Escrever às vezes dói. E, por vezes, eu sou um tanto masoquista.

Cada parte de mim parece reagir a sua maneira.

Quase médico e monstro. Lobo da Estepe.

Enquanto os ombros doem de tensão, a alma respira aliviada. Como se me cobrasse: "Pensei que você fosse se entregar a essa vidinha".

Ainda não sei o que há em rotinas que me incomode tanto, mas me incomodam.

Andei buscando liberdade e agora que estamos frente a frente, os instintos se chocam com os medos burgueses.

Vontade contínua de ir embora, medos contínuos da solidão.


No calor do meu quarto, um copo de suco nas mãos, novos baianos na caixa de som, cachorra chorando no corredor, medos e anseios rondando meus pensamentos.


Têm horas que a preguiça de tudo que eu tenho se mistura ao receio de tudo que penso que quero.

"Uma dessas pessoas que pareciam viver só pelos sentidos. Uma inocente. Que transitava pela vida dos outros, quebrando seus moldes, seduzindo, mas sempre acabava partindo. Talvez seja verdade, afinal, que corre sangue cigano em suas veias. Faca de dois gumes, sem dúvida, pois graças a isso, Santiago Blanco se apaixonou, mas justamente por isso nunca largou tudo por causa dela. Quando quis fazê-lo, nos últimos anos, já era tarde."
"Vou mostrando como sou
E vou sendo como posso,
Jogando meu corpo no mundo,
Andando por todos os cantos
E pela lei natural dos encontros
Eu deixo e recebo um tanto"
(Morais Moreira - Os Novos Baianos)