sexta-feira, 29 de agosto de 2008

City Tour

Diário de uma guia turística por um dia


A noite de terça terminou bem. Cervejinha na varanda, Chico no DVD e um bom papo pra rever velhas histórias. Roa Bastos acabou no meio da madrugada e fui sonhar com as próximas páginas de Eva Luna.

Dormi incumbida de programar um passeio: levar um aluna da minha avó, que nunca havia saído de Três Corações, para conhecer o Rio em oito horas.

Pensei no caminho, em como otimizar o tempo, na linearidade do passeio, para que não se desse voltas desnecessárias, mesclar programa cultural com beleza natural, levar a lugares por onde eu ando bem, para me assegurar de dar informações precisas.

Saímos de Pendotiba às dez e meia da manhã. Decidi pela barca, mesmo sendo um caminho mais longo, mas para aproveitar a vista. A assim fomos, Simone e eu. Ela descobrindo cenários que nunca havia visto ao vivo e eu redescobrindo as belezas que, depois de um tempo, passam quase despercebidas.

Da barca ela já ia fazendo perguntas sobre todos os prédios e morros que avistava. Aeroporto, bases militares, escola naval, Cristo Redentor, Pão de Açúcar, Ponte Rio - Niterói, Ilha Fiscal.

Da Praça XV em diante, fomos caminhando pelas ruas que um dia foram o centro político e econômico do país.

Paço Imperial, Centro Cultural dos Correios, Casa França-Brasil, CCBB, Candelária, Igrejas e ruas do centro da cidade. Caminhamos a passos largos pela Av. Rio Branco até chegar ao Teatro Municipal. E foi aí que as minhas redescobertas começaram. Entrei pela primeira vez no Museus de Belas Artes. Li cada legenda e acabei passando mais tempo do que ela pensando em tudo que se esconde nos prédios por onde passamos apressados quase diariamente, sem nos darmos o presente de olhar para eles com um pouco mais de suavidade, dispostos a admira-los por alguns segundos.

Biblioteca Nacional, Cine Odeon, uma breve parada no Mac. Donald's e fomos de metrô até o Catete. Às três da tarde, ela já tinha conhecido boa parte do centro do Rio e eu ia gradativamente me aproximando dos cenários da minha infância.

Entramos no Museu da República pelos jardins. Logo na entrada comecei a perceber que aquele passeio, em alguns momentos, mexia mais comigo do que com ela. O parquinho onde eu brincava, as grutas que morria de medo de entrar, o cinema em que assisti pela primeira vez um dos filmes que mais marcou minha infância (A Incrível Jornada), o caminho da peça de teatro que eu mais me recordo (Romeu e Julieta). Os cheiros da minha infância me trazem uma nostalgia gostosa muitas vezes.

Dentro do Museu não foi diferente. Agora, porque a idéia de que tantos momentos históricos se passaram dentro daquelas salas, me desperta um facínio absurdo. Saber que circulando naqueles corredores Getúlio Vargas resolveu dar fim a sua vida, que naquelas enormes mesas ocorriam reuniões que marcaram o futuro do país. Hoje, nosso presente. Tudo isso me traz emoções que não sei explicar.

Para completar o passeio histórico, uma exposição sobre 68 que me arrancou lágrimas em menos de cinco minutos.

Já íamos embora quando me lembrei do Museu do Folclore, logo ao lado e que, para minha descoberta, tem entrada pelos jardins do Palácio do Catete. E ali, onde eu não esperava ver mais nada que me comovesse tanto, em uma pequena sala, vi a exposição que marcou meu dia. Uma homenagem a Mestre Bimba, o mais importante mestre de Capoeira que já existiu. Instrumentos, vídeos, fotos e documentos que registram os caminhos da arte pelo Brasil e pelo mundo. Naquele momento, tive vontade de descalçar os sapatos, pôr as mãos espalmadas no chão e entrar na roda imaginária onde eram projetadas as imagens de grandes capoeristas.

Do Catete para a Lagoa, voltando pela orla até o Arpoador. Sentamos para ver o pôr-do-sol, que não veio. A única nuvem no céu tampava o exato lugar onde ele se esconde, atrás do Leblon.

As horas passavam depressa e já não havia mais tempo de mostrar nada. O trajeto do ônibus para a rodoviária fez o favor de passar pelos lugares que ela ainda não tinha visto: Campus da UFRJ na Praia Vermelha, Enseada de Botafogo, Pão de Açúcar bem de perto, Aterro do Flamengo, MAM, mais prédios históricos do centro do Rio, Central do Brasil.

No fim do dia, exaustas de tanto andar, mas com os corações cheios das emoções do caminho, fomos cada uma para seu destino. Simone, de volta para Três Corações, eu, de volta pro cantinho de Pendotiba, para dormir com o som do vento.



"
Eu andava meio estranho
Sem saber o que fazia, eu não sei
Andava assim eu não sei
Se era feliz
Eu achava que faria uma canção
E a melodia, eu não sei
Andava assim,eu não sei
Se era feliz"
(Oswaldo Montenegro)

Um comentário:

Anônimo disse...

... fofo!!!!
confesso que em todos os lugares assim, de uma vez só, me daria um pouco de preguiça.
essa coisa de mochila, viseira e gatorade não é muito comigo.
mas metade delas, com direito a uma cerveja na lapa à noite, eu aceito como forma de hospitalidade quando eu for te visitar.
porque de acordo com as leis da hospitalidade, que se aprende no primeiro período da graduação em Turismo, a hospitalidade move o mundo, e consiste no seguinte ciclo: dar, receber e retribuir.
quem sabe vc não segue carreira? rs Turismo é igual coração de mãe e casa de vó, sempre cabe mais um.